Sem ao menos ser julgado, foi arquivado nesta segunda-feira o inquérito que tramitava há mais tempo no Supremo Tribunal Federal (STF). O caso chegou à Corte em outubro de 2003, estava em segredo de justiça e investigava o senador Jader Barbalho (PMDB-PA), suspeito de peculato, tráfico de influência e lavagem de dinheiro. As penas máximas previstas para esses crimes somam 27 anos. A investigação foi encerrada sem conclusão porque houve extinção da punibilidade, ou seja, passou-se tanto tempo que o investigado não poderia mais ser punido, mesmo condenado.
Durante esse período, o inquérito, iniciado em 2002 na Justiça Federal de Tocantins, percorreu diferentes instâncias judiciárias em Brasília, Palmas e São Luís, por conta do foro especial — num percurso de 4.809 quilômetros, até acabar nas gavetas do STF. Pela Constituição, senadores e deputados devem ser julgados pelo STF. A primeira instância cuida das pessoas sem foro.
O objetivo do inquérito era investigar desvio de recursos da extinta Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Os crimes teriam ocorrido em 2000. Como o caso está sob sigilo, não se conhecem detalhes do processo.
GILMAR, O PRIMEIRO RELATOR
Em Tocantins, o Ministério Público apresentou denúncia contra Jader, mas o caso não virou ação penal. Em 2003, quando Jader assumiu como deputado federal, o inquérito subiu ao STF pela primeira vez. O relator sorteado foi o ministro Gilmar Mendes.
Em 2005, o STF considerou nula a denúncia apresentada na primeira instância, porque o caso deveria ter sido investigado desde o início no Supremo, por conta do foro especial. Em 2008, o tribunal desmembrou o inquérito e deixou na Corte apenas o inquérito de Jader; os outros 24 investigados foram para a primeira instância, porque não tinham direito ao foro privilegiado.
Por ter assumido a presidência do STF em 2008, Gilmar deixou de relatar o inquérito. A responsabilidade foi transferida para a ministra Ellen Gracie, hoje já aposentada. Em 2009, o Ministério Público Federal apresentou denúncia contra Jader e, dessa vez, ao STF, responsável por julgar parlamentares.
O Supremo não teve tempo de analisar a denúncia: no ano seguinte, os autos foram enviados para a Justiça Federal de Tocantins, porque Jader renunciou ao mandato de deputado. Em 2011, a primeira instância de Tocantins concluiu que os fatos não deveriam ser apurados lá, mas na Justiça Federal do Maranhão, para onde o inquérito seguiu.
Em 2012, o caso voltou ao STF: Jader tinha sido eleito senador. O ministro Luiz Fux foi sorteado o novo relator. Ainda em 2012, Jader apresentou defesa preliminar à denúncia. Foi quando o próprio Ministério Público reconheceu que houve prescrição quanto ao tráfico de influência. Como o crime é de pena menor (de dois a cinco anos de prisão) a prescrição é mais rápida.
Em 2013, Fux se declarou impedido para julgar o assunto. Rosa Weber foi, então, sorteada a quarta relatora do caso. Em outubro de 2014, Jader completou 70 anos. Pela lei penal, o tempo de prescrição de crimes para pessoas com essa idade é reduzido à metade. Por isso, Rosa decretou a extinção da punibilidade dos crimes no último dia 11 de março. Pela legislação, a pena para peculato é de dois a 12 anos de prisão. A pena para lavagem de dinheiro é de três a dez anos.
O advogado de Jader, José Eduardo Alckmin, não credita o arquivamento do inquérito sem julgamento à mudança constante de foro. Para ele, as investigações não prosseguiram por falta de prova robusta:
— O arquivamento mostra exatamente que a cogitação inicial estava totalmente desprovida de provas mais seguras. Nesse tempo todo, houve um esforço do Ministério Público em criar uma prova robusta. Como o fato cogitado não tinha efetivamente fundamento, o tempo correu e não se chegou aos elementos que poderiam corroborar uma possível acusação. Nada foi confirmado — disse.
OUTROS CASOS NO SUPREMO
Para o advogado, as mudanças de foro não colaboram tanto com o atraso das investigações. Afinal, as diligências são cumpridas pela Polícia Federal e o juiz age como coordenador do inquérito nessa fase.
— O atraso é relativamente pequeno, porque a investigação está sempre a cargo da Polícia Federal. O juiz apenas exerce supervisão. O fato de ser juiz do primeiro grau ou ministro do Supremo não faz diferença. Mas, quando não se tem prova segura, não tem como o processo andar — argumentou.
Além desse caso, Jader responde a outras dezenas de inquéritos e ações penais no STF, alguns em segredo de justiça. Parte das investigações foi motivada por desvios de dinheiro da extinta Sudam, órgão ao qual Jader tinha influência política. Para Alckmin, todas as acusações são descabidas porque seu cliente não poderia ter conhecimento de tudo o que ocorria na Sudam.
INQUÉRITO VIROU AÇÃO PENAL
Em outubro do ano passado, um dos inquéritos que tramitam no STF contra Jader foi transformado em ação penal. Nesse caso, ele é investigado por peculato e lavagem de dinheiro. Segundo a denúncia do Ministério Público Federal, o réu contribuiu para desvios de R$ 22,8 milhões da Sudam, entre 1997 e 2000. Segundo as investigações, o parlamentar cobrava dinheiro para aprovar projetos. A propina era de 20% do valor do contrato.
Nessa investigação, Jader foi acusado de desviar dinheiro do Fundo de Investimento da Amazônia (Finam) para custear um projeto da Agropecuária Xavante. A empresa teria prestado o serviço, mas contribuiu para o desvio de dinheiro público. Segundo o Ministério Público, Jader usou seu prestígio para garantir a nomeação de superintendentes da Sudam que permitiram o funcionamento do esquema.
O Globo