Vereador acusado de homicídio é cassado por receber “ajudinha” de deputado
Juiz eleitoral entendeu que repasse de R$ 1 mil feito supostamente pelo então deputado Poti Junior para campanha de 2012 foi ilícita.
Por Thyago Macedo e Sérgio Costa
Foto: Reprodução
O vereador da cidade de Vera Cruz, Cleonado Joaquim de Oliveira, preso no ano passado por um crime de homicídio e que também teve uma ossada humana encontrada em um sítio de sua propriedade, foi cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RN). Ele teria recebido uma “ajudinha” de um deputado estadual e não declarou os valores, configurando prática de caixa dois.
O juiz eleitoral Marcos José Sampaio de Freitas Júnior, da comarca da Monte Alegre, entendeu que o vereador realizou “captação ilícita de recursos com fins eleitorais”, no pleito de 2012 e, por isso, além de determinar a cassação do mandato dele, estabeleceu inelegibilidade por oito anos.
Na sentença, o juiz usou como argumentos interceptações telefônicas, inclusive do período em que Cleonaldo estava preso. As conversas indicam o recebimento da quantia de R$ 1 mil e que o valor teria sido repassado pelo então deputado estadual Poty Junior.
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Veja abaixo o que escreveu o juiz na sentença:
Com efeito, as conversas gravadas evidenciam a seguinte seqüência de acontecimentos: em 26/09/2012 (16h30min54s), o representado, que estava preso, fala ao telefone (terminal (84) 8784-8831) com seu filho JÚNIOR, indagando se ele ainda tem uma conta-poupança na Caixa Econômica. JÚNIOR confirma que tem. Em seguida, a Sra. Luzineide (esposa de Cleonaldo e mãe de JÚNIOR) pergunta o número da agência e da conta-poupança e então JÚNIOR repassa os dados solicitados: agência 0034, operação 13, Conta 025958-3 (fl. 16).
Na mesma data, pouco depois (16h34min45s), é a vez de LUZINEIDE manter conversa pelo terminal n.º (84) 8831-9888 com outra pessoa também conhecida por JÚNIOR. Relembra, então, ao interlocutor que, pela manhã, este havia lhe pedido o número de uma conta poupança na Caixa Econômica e, em seguida, pede-lhe que anote e repassa os dados da conta poupança de seu filho. O interlocutor, então, diz que, quando fizesse, ligaria avisando (fl. 17).
No dia seguinte (27/09/2012), às 08h22min39s, a tal pessoa conhecida por JÚNIOR ligou para LUZINEIDE identificando-se como "a pessoa que trabalha com o deputado" . Em seguida, diz que já foi resolvido e que "ele" mandou uma "ajudinha" . LUZINEIDE pergunta se a "ajudinha" foi feita no Banco do Brasil ou na Caixa Econômica. JÚNIOR diz que foi na poupança da Caixa (fl. 18).
No minuto seguinte (08h23min56s), LUZINEIDE fala com seu filho JÚNIOR. Orienta-o a verificar sua conta para confirmar um depósito e, se realizado, sacar o valor depositado, afirmando que "o deputado disse que botou" . JÚNIOR pergunta se foi "Poty" e LUZINEIDE confirma, ao que JÚNIOR pergunta, então, quanto foi depositado, recebendo a resposta de que não foi dito o valor (fl. 18).
Em 28/09/2012, às 08h13min25s, nova conversa de LUZINEIDE em que o interlocutor, identificado como seu filho, relata que "ele" só depositou R$ 1.000,00, deixando LUZINEIDE surpresa. O interlocutor diz então que "naquela época de deputado foi só aquilo" e que "nessa época de vereador" já imaginaria isso (fls. 20/22).
Efetuada a requisição do extrato da conta mencionada nas conversas acima referidas, a confirmação: em 27/09/2012, depósito da quantia de R$ 1.000,00 (fl. 247).
Ora, é fato que, ao prestar contas de sua campanha à Justiça Eleitoral (processo n.º 1511-17.2012.6.20.0044), não houve nenhuma menção a essa doação, como se vê pelas cópias às fls. 35/95 (as cópias de fls. 96/230 aparentemente foram anexadas à inicial por engano, vez que consistem na prestação de contas de outro candidato). Aliás, é importante destacar, quanto a isso, que o representado em nenhum momento admitiu a ocorrência da doação e, depois que a realização do depósito foi confirmada pelo extrato bancário, salientou que tais recursos não teriam sido utilizados na campanha eleitoral, embora o caput e art. 30-A da Lei n.º 9.504/97 e seu 2.º façam referência alternativa, e não cumulativa, à arrecadação e ao gasto de recursos de forma ilícita.
Prosseguindo, vê-se que a finalidade eleitoral dos recursos arrecadados está evidenciada plenamente pelo seguinte conjunto de circunstâncias: o depósito bancário foi feito faltando pouco mais de dez dias para eleição e foi sacado em 04/10/2012, como se vê pelo extrato de fl. 247, na fase final da campanha. A autoria da doação mencionada nas ligações interceptadas foi indicada como sendo do então deputado Poty Júnior, por intermédio de uma pessoa que dizia trabalhar para ele, e, o mais importante, a última das conversas transcritas acima não deixa dúvidas: "naquela época de deputado foi só aquilo" e que "nessa época de vereador" já imaginaria isso (fls. 20/22); ou seja, conversando com a esposa do representado, interlocutor identificado como seu filho compara o depósito recebido com outro feito em campanha eleitoral anterior, para deputado, o que deixa claro que ambas foram realizadas com fins eleitorais.
A reportagem do Portal BO tentou contato diversas vezes com a Câmara Municipal de Vera Cruz para saber quem assumiu a vaga dele, no entanto, o telefone só chamou. Cleonado Joaquim, que já foi presidente da Câmara Municipal daquele munícipio, foi preso em junho de 2012, pelo assassinato de José Edenilson Fernandes da Silva e por porte ilegal de arma.
Em setembro, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), juntamente com a Polícia Civil, localizou uma ossada humana enterrada no sitio de Cleonaldo, em Vera Cruz. O corpo seria de Paulo Sérgio de Araújo, que havia sido sequestrado em 2009. Atualmente, Cleonaldo também responde processo no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte por homicídio qualificado (0000548-32.2012.8.20.0144), roubo (0001315-12.2008.8.20.0144) e crime contra o Sistema Nacional de Armas (0000600-33.2009.8.20.0144).
O advogado Thiago Cortez, que integra a defesa de Cleonaldo, disse ao Portal BO que ele já está afastado das funções e que um recurso já foi negado. Mesmo assim, a defesa já entrou com novo recurso e aguarda julgamento do pedido.
Do:Portal BO
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